A voz baixa contrasta com a grande força psicológica. Desistir do futebol, para ele, é uma hipótese fora de cogitação. Uma semana após o incêndio que causou a morte de 10 meninos das categorias de base do Flamengo, Cauan Emanuel concedeu entrevista ao GloboEsporte.com. O jovem de 14 anos é um dos três que se feriram na tragédia, entre os 16 sobreviventes. O mais importante é que ele está bem.
- Estou bem melhor, me recuperando bem. O Flamengo está me dando todo apoio, minha família, meu empresário também está me dando toda a força. Agora é só fazer dentro de campo, dar felicidade para aqueles moleques, aqueles garotos que estavam ali comigo. Tenho certeza que Papai do Céu sabe o que faz com eles lá em cima.
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Cauan teve alta hospitalar no início da semana e na noite dessa sexta-feira viajou com a família para Fortaleza . Em recuperação física e psicológica, ele passará um período na terra natal – o Flamengo suspendeu todas as atividades do futebol de base por tempo indeterminado. Mas ele espera que em breve as coisas voltem ao normal.
- Sou um cara que gosta de jogar futebol, e sempre tive o apoio da minha família e do meu empresário. São pessoas que vão estar do meu lado sempre. E foi o que sempre eu falei para eles: nunca vou desistir do futebol. Sempre vou continuar no Flamengo, independentemente de tudo. Pode ter acontecido, mas não vou desistir.
Na última quinta, Cauan viveu um dia ao mesmo tempo difícil e especial. Ele esteve no Maracanã e viu de perto as homenagens de Flamengo, Fluminense e das duas torcidas aos amigos que se foram. E depois conheceu Tite.
- Foi bem emocionante para mim, bem triste. Mas feliz também por estar mais um dia, ali, representando meus amigos. Muito triste também, nem sei muito o que falar. Ver aquelas famílias, ali, sem os seus filhos, me emocionei bastante ao ver a imagem dos meus amigos passando no telão, não tendo eles do meu lado.
Do técnico da seleção brasileira, Cauan ganhou um presente: uma pulseira com imagens de Nossa Senhora Aparecida, de quem Tite é devoto.
- Foi uma surpresa. Ele me apoiou, me deu força, me deu uma grande esperança para continuar no futebol e um presente também, que vai estar sempre guardado comigo, nunca vou tirar do meu braço. Agradeço muito a ele por ter me convidado. Ele falou que um dia, se Deus quiser, vou estar na seleção brasileira.
No momento do incêndio, o quarto de Cauan tinha ainda Francisco Dyogo, Jhonata Ventura e Áthila Paixão. Os três primeiros se feriram, mas sobreviveram – o último acabou falecendo. Ele relatou o que lembra da tragédia.
- Eu estava dormindo e escutei os gritos do Dyogo e do Jhonata. Eu pensava que tudo era uma brincadeira, porque a gente brinca toda noite. Na hora que ele abriu a porta, senti o vento quente na minha cara e não dava para sair. Estava bastante quente e não sabia o que fazer na hora. Sentei no chão, não sabia o que fazer. E pensei na janela, nas grades. Consegui quebrá-la.
- O segurança Ferreira me ajudou a tirar, o monitor Vinicius também. A gente conseguiu tirar o Jhonata Ventura, que estava sem força e não estava conseguindo, e depois o Francisco Dyogo, que estava bastante machucado. Eu estava menos machucado. Tentamos ajudar outros também, só que o que estava no meu quarto (Áthila) já estava apagado.
Cauan também falou sobre as condições do alojamento onde houve o incêndio.
- Era tudo confortável, o quarto, a cama, alimentação… Tudo no conforto para a gente. O Flamengo sempre deu uma boa estrutura para nós.
Forte psicologicamente, Cauan Emanuel trata o incêndio como um renascimento pessoal e acredita que ficou muito mais maduro após o episódio. Ele segue firme em busca dos objetivos.
- Meu sonho é me tornar jogador da seleção brasileira e poder ajudar minha família. É um sonho que sempre tive, jogar com aqueles grandes jogadores, Neymar, Gabriel Jesus, Willian, Coutinho…
Globo Esporte